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domingo, 9 de outubro de 2016

VISITA


Você está tranquilo em casa, vivendo de maneira comum seus dias comuns de repente ouve um toc toc sorrateiro vindo da porta de entrada. Há vida. Certamente, por estar em casa, você veste a roupa mais confortável, desbeiçada e esquisita que tem, mas, minimamente, troca a camiseta e dá um tapinha no cabelo para atender a porta. Metaforicamente falando é assim que recebemos as pessoas em nossa vida.

Visitas que aparecem para dar um oi e que muitas vezes vêm sem avisar. Gente que chega devagar, taciturna, gente que chega na curtida de uma foto da rede social ou com um pouco mais de ousadia comentando algum post; gente que "bate à porta" com um olhar mútuo em caso de estar no mesmo ambiente. Gente que chega, simplesmente.

Não é preciso muito na verdade para irmos até a porta para abri-la, mas o deixar entrar talvez seja o grande Q da questão. A beleza é um cartão postal, uma espécie de aperitivo para o convite, mas após quinze minutos mais predicativos deverão ser revelados, superficialidade costuma assustar. Basta de relações rasas e pessoas idem.

O tempo é um aliado. Se com ele o assunto encaixa, engata e flui começamos a ficar estarrecidos por encontrar, assim, quase sem querer, um alguém com quem se tem afinidade; convenhamos, não é das missões mais fáceis na era do mi mi mi.

Com a naturalidade da boa conversa, as semelhanças nos gostos, a troca de ideias e pontos de vistas, o bom humor, as teorias da conspiração e papos cabeça, com tudo isto surge o encantamento... aquela praticamente súbita sensação de admiração e bem querer.
A gente passa a querer um "bom dia", esperar um "durma bem" e até "que saudade" com regularidade. Adaptamo-nos tranquilamente com atenção. Quem não?

O espaço ganho não abre espaço para cobranças efetivas, mas de algum modo surge uma licença natural para que nos lembrem do remédio, do horário no compromisso, até mesmo da conta a pagar. Gente que chega para somar. Com quem adoramos falar, sair, estar. Gente especial.

Ah, claro que surgem as dúvidas, o medo de embalar numa rotina nova, mas ao mesmo tempo brota uma tranquilidade ímpar e uma certeza incontestável de estar seguindo o fluxo. Go with the flow...

Eis que da porta da casa a relação evolui para a sala, da sala para cozinha porque todos têm fome (risos) e depois sobe as escadas para adentrar a um quarto, afinal o desejo é parte do pacote,  do quarto para a vida. Questão de sorte, escolha, disposição ou tudo isso ao mesmo tempo?

Aquele alguém, a visita despretensiosa que deixamos adentrar ganha seu espaço, ganha vez e voz, menção honrosa. A vida passa a dar sinais, no chat, nas últimas ligações recebidas. O coração demonstra aprovação por palpitar descompassado a cada notificação que sobe com nome específico; a mente revisita, revive, ressente, toda hora e novamente.

No final das contas a existência humana é cheia dessas peripécias de reservar momentos, a parte que nos cabe é vivê-los e apreciá-los enquanto nos forem cedidos. Quando duas pessoas têm a chance de se aproximar e não o fazem, talvez seja um tremendo desperdício de oportunidade. Sabe aquele alguém que está por aí? No metrô, na rua, lendo um livro no horário de almoço, andando distraído pelo centro, lendo esse texto? Então, este alguém pode estar esperando por você para, no mínimo, dar boas risadas. Permita-se. A vida é isso que acontece enquanto perdemos tempo analisando demais.


BC.  

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